sexta-feira, 2 de setembro de 2011

GAROTO DA GAITA


03/09/2011

Remexendo em antigos papéis, encontrei uma pequena crônica escrita em 15/04/1985 ─ 12:20 horas, num bar do calçadão,  de Londrina.

É interessante.   Alguns momentos na vida da gente,  marcam.  Ao reler  a pequena crônica lembrei de todos os detalhes; lembrei do garoto, lembrei algo do som de sua gaita; lembrei do sol forte e do céu totalmente azul, sem uma nuvenzinha ─ céu de Brigadeiro, como se costuma falar.

Resolvi, então, postá-la,  como um momento de relax. Pena que não sei o nome do garoto; não sei de seus caminhos, não sei onde está e ele, também, não tem a mínima ideia de que alguém, um dia, escreveu uma crônica para ele e após 26 anos, postou-a, num blog, coisa que nessa época, não existia, é claro.  Que barato, não?

Bem, vamos à crônica, em itálico.

Mesas lotadas.

Entre cervejas, sucos, rápidas refeições e o zum-zum-zum dos papos, uma gaita de boca inicia, timidamente, o entoar de uma canção.

É um jovem, com 18/19 anos quem se aventura ao som da gaita em meio ao burburinho do vai e vem das pessoas; tênis, sandálias, botas, sapatos, nas mais diversas cores, abrigam os pés dos que caminham quase que, desordenadamente.

E o garoto da gaita, ainda indeciso entre tocar e não tocar, coça a cabeça num gesto de dúvida; seu parceiro de mesa deve ter-lhe dito alguma coisa à qual ele não concordou, de cara.

Engraçado, entre todos os calçados que caminham pelo calçadão e os estacionados, nas mesas, o dele é diferente; é feito de couro, desenhos coloridos, grossos cordões e seus pés são calmos; não demonstram agitação, como os demais.

De repente, toma coragem e inicia uma canção, desconhecida para mim, mas linda; talvez de sua própria autoria; quem sabe.

Então, seus pés quietos, sua música suave, seus longos cabelos em desalinho ─ de um castanho claro que reflete o sol ─,  seu sapato diferente e seus olhos ligeiramente sonhadores destoam,  completamente, de tudo que há, ao redor.

Lembra-me um “alienígena” urbano, tão diferente é, dos demais.

Será que ele sabe do Tancredo? Será que ele sabe da máquina, da engrenagem, do sistema?

Ou será que nada sabe do “concreto”? 

Será que  sabe de seus cabelos em desalinho?  De seus olhos sonhadores?  De sua gaita de boca?  De sua canção suave?  De sua sandália colorida? De seus pés calmos?

Talvez,  por ele nada saber, de tudo que aí está, o que aí está lhe paga na mesma moeda; pois do garoto  da gaita, cabelos longos,  música suave e sandálias coloridas, talvez também, ninguém saiba.


Maria ─ Estrela Lunar Amarela


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